A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que rejeita a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas deve ampliar a insegurança jurídica no campo e afetar diretamente investimentos, crédito e uso produtivo da terra, segundo a advogada Márcia de Alcântara, especialista em Direito Agrário e Agronegócio do escritório Celso Cândido de Souza Advogados.
Na quarta-feira (17), o STF formou maioria contra o entendimento de que só poderiam ser demarcadas terras indígenas ocupadas até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.
O entendimento contrário foi consolidado com os votos dos ministros Gilmar Mendes, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes.
Segundo a advogada, o afastamento do marco temporal altera a lógica de previsibilidade sobre a posse da terra no Brasil. Para ela, a decisão permite a reabertura de discussões sobre propriedades antigas, mesmo quando há títulos regularmente registrados e adquiridos de boa-fé.
Do ponto de vista jurídico, Márcia afirma que o novo entendimento gera instabilidade possessória em larga escala. Na prática, a possibilidade de revisão de títulos pode afetar áreas produtivas consolidadas há décadas.
“Do ponto de vista do direito agrário, o afastamento do marco temporal provoca uma instabilidade possessória sistêmica. Abre-se a possibilidade de revisão de títulos de propriedades antigos, regularmente registrados e transmitidos de boa-fé, o que compromete a previsibilidade necessária para quem produz e investe no meio rural”, afirma.
Ela explica que, quando a segurança do título é colocada em dúvida, o impacto econômico é imediato, com paralisação de projetos, retração de investimentos e desvalorização de terras em regiões sob conflito fundiário.
Outro ponto sensível, segundo a especialista, é o efeito sobre o direito de propriedade e o princípio do ato jurídico perfeito, ambos previstos na Constituição.
Na avaliação da advogada, imóveis sob disputa deixam de ser aceitos como garantia em operações de crédito rural, o que dificulta o acesso a financiamento e compromete o planejamento das atividades agrícolas.
“Enquanto a indenização não ocorre, o produtor fica imobilizado. O imóvel perde liquidez, enfrenta entraves para licenciamento ambiental e não serve como garantia bancária”, explica.
O voto do ministro Gilmar Mendes prevê a permanência do ocupante não indígena até o pagamento de indenização e reconhece a validade de contratos e atividades econômicas firmadas nessas áreas.
Para Márcia, a medida busca mitigar danos, mas não resolve o problema central. A ausência de prazos claros para indenização mantém o risco jurídico elevado.
Ela ressalta que contratos de arrendamento, parcerias e investimentos em áreas potencialmente afetadas exigem cautela adicional. A recomendação é reforçar cláusulas resolutivas e realizar auditorias fundiárias mais profundas antes de qualquer operação.
O STF estabeleceu o prazo de dez anos para a conclusão das demarcações pendentes. Para a advogada, o horizonte é pouco factível diante da complexidade do processo.
“O procedimento envolve estudos antropológicos, etapas administrativas e contestações judiciais. A União não tem orçamento nem estrutura para indenizar milhares de propriedades nesse período”, avalia.
Segundo ela, isso pode levar a decisões aceleradas e a um aumento expressivo da judicialização, prolongando conflitos fundiários.
Apesar do entendimento do Supremo, o tema segue em disputa institucional. O Congresso Nacional discute uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o marco temporal.
Na visão de Márcia de Alcântara, o Legislativo ainda tem espaço para atuar. Uma eventual regulamentação poderia reduzir conflitos e aumentar previsibilidade, desde que preserve os direitos indígenas previstos na Constituição.
Caso a PEC avance, o embate tende a retornar ao Judiciário, prolongando o cenário de incerteza.
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